Por Francisco de Carvalho Florêncio
(Engenheiro aposentado e pesquisador da história de Princesa Isabel - PB)
VÍDEO SOBRE...
A História da Revolta de Princesa Isabel na Paraí¬ba - PB
HISTÓRIA DE PRINCESA ISABEL- PARAÍBA
APRESENTAÇÃO
Há muito tempo, MARDSON MEDEIROS convidou-me para participar no seu site “PRINCESAPB” com matérias sobre a história de Princesa Isabel. Resisti, pelos mais diferentes motivos. Pelos mesmos motivos que não o fazia por outros meios. Finalmente cedi. Depois de quatro anos de pesquisa, escarafunchando livros, documentos, onde eles pudessem ser encontrados, finalmente dei por concluída a etapa de pesquisa. Um enorme trabalho ainda está por fazer na organização do material resgatado, para poder disponibilizá-lo para quem dele precisar.
Cedi em nome daqueles que me cobram quase que diariamente o livro (que não é parte, ainda, do meu projeto de resgate histórico) sobre a história do povo princesense. O que apresentarei aqui no site, terá o mesmo conteúdo – com adaptações – publicado no jornal “FOLHA DE PRINCESA”, com a diferença principal de que aqui no site, o conteúdo será composto de diversos artigos em blocos homogêneos por capítulos.
Muito já se escreveu sobre Princesa (vou usar esta denominação, no lugar de Princesa Isabel, por simplificação). Quase tudo relativo à grande epopéia da revolta de 1930. Quase nada sobre suas origens remotas, e quase sempre sem apoio de documentação e fontes fidedignas que permitam uma reconstrução do seu passado histórico. Na dúvida de que a fase atual do meu projeto possa ainda demorar muito, resolvi mudar o roteiro e oferecer aos princesenses e outros interessados, aquilo que aprendi na minha tarefa de resgatar o patrimônio documental da história de Princesa. Planejo escrever da forma mais direta e simples possível.
Desejo fazê-lo principalmente para a nova geração ainda com menos de 30 anos, sem preocupações de natureza acadêmica, sem análises historiográficas aprofundadas. Usarei o estilo jornalístico. Leve, superficial e centrado nos fatos relevantes e interessantes. Usarei um roteiro por ordem cronológica dos fatos. Mesmo que isso contrarie o pensamento dos novos historiadores vindos da academia. Eles que peguem esse material e o façam ao estilo deles! Independente do estilo, todas as informações apresentadas são lastreadas em documentos oficiais (fontes primárias) ou contidas em outras publicações (fontes secundárias). Muito pouco vindas de relatos orais ou de fontes nitidamente duvidosas. Para evitar um texto pesado e de leitura especializada, dispensarei as referências bibliográficas que serão incluídas no final desta série de artigos.
INTRODUÇÃO
Dividi a história de Princesa em 5 grandes capítulos:
PRÉ-HISTÓRIA
– o tempo anterior ao início do desbravamento da região pelos colonizadores portugueses ou nativos brasileiros, ou seja, do ano 1500 a meados de 1760. Apresentarei os fatos relativos à ocupação do sertão paraibano e pernambucano, que antecederam e prepararam a chegada dos primeiros desbravadores da região onde hoje se situa o Município de Princesa Isabel, no Estado da Paraíba.
DESBRAVAMENTO
- período que vai de 1760 (Séc. XVIII) até 1858 (Séc. XIX), fase da ocupação territorial pelas primeiras famílias de desbravadores.
FUNDAÇÃO
– PRIMEIROS ANOS
– a partir da construção da pequena capela em 1858, o início do arruado, até 1875, quando então se torna a Vila da Princeza (assim mesmo, com “z”).
DE VILA À “TERRITÓRIO LIVRE” – a partir da emancipação política e administrativa em 1875 até à epopéia da revolta de 1930.
ERA CONTEMPORÂNEA
- período que vai de 1930 até os dias atuais.
Onde for interessante, junto com a descrição dos fatos e datas, acrescentarei anotações sobre a genealogia das famílias, estórias e curiosidades que possam dar um sabor especial a história do povo princesense.
PRÉ-HISTÓRIA
Localizemos a região onde está situado o Município de Princesa Isabel e sua sede de mesmo nome. No Brasil, no extremo sudoeste do Estado da Paraíba, fronteira com o Estado de Pernambuco. Repousa sobre o altiplano da Serra da Borborema, nos contrafortes do Rio Piancó, em altitude média de 700 m. Para efeito de inclusão neste trabalho, considerarei todos os seus antigos distritos e povoados (S. José, Manaíra, Tavares, Juru e Água Branca, Patos e Belém) como partes integrantes da história de Princesa, até o momento das respectivas emancipações e desmembramentos.
ERA PRIMITIVA
De acordo com estudiosos do assunto, foi há 40.000 anos atrás que chegaram os primeiros habitantes do continente americano. No Brasil, especialmente no Nordeste, a presença humana é de mais ou menos 10.000 anos. Na região de Princesa, no sítio Lagoa da Fazenda foram encontrados traços da presença indígena, tais como artefatos de cerâmica. Nenhum estudo sobre a origem e data desses achados foi feito até agora.
Os povos indígenas que habitavam na região do Vale do Piancó eram denominados tapuias (classificação geral dada aos índios selvagens, indomáveis, bárbaros), principalmente as tribos Panatis, Coremas e Icós, todos inclusos na nação Cariri (ou kiriri). Considerando que a Serra da Borborema deve ter sido uma barreira natural ao acesso desses povos a região de Princesa, podemos assumir também que é mais provável que os povos indígenas que possam ter circulado por ela, tenham sido Cariris que viviam no vizinho Vale do Pajeú e na Serra da Baixa Verde, pelo lado pernambucano. Seriam eles os aracapás, carnijós, gurguás ou guegês, paiaiases, xucurus, quesqués, pipipans, umãs e xocós. Estes quatro últimos foram aldeados na Serra da Baixa Verde em 1802, cuja aldeia estava onde atualmente é a cidade de Triunfo (Pe), vizinha de Princesa.
Não há registros de lutas ou presença de índios, a não ser a partir da chegada dos primeiros desbravadores, quando encontramos algumas referencias sobre eles. Uma dessas referencias é a denominação de locais na região de Princesa, tais como Riacho do Tapuio, Serrote do Tapuio, que dá a entender sobre a presença de índios nestes locais na época do desbravamento.
Na tradição oral encontramos referencias de casamentos de ancestrais nossos com “índias pegas à laço” e se pode observar nos traços fisionômicos de muitos sertanejos com “cara de índio” que encontramos entre a gente princesense.
DESBRAVAMENTO (1766 – 1858)
POVOAMENTO DO SERTÃO
O desbravamento da região de Princesa é antecipada pela saga da penetração do sertão pernambucano, em especial a formação da vizinha cidade de Flores (Pe), a “avó” de Princesa, como demonstrarei nos capítulos futuros.
Flores, situada à apenas 18 quilômetros ao sul de Princesa, tem suas origens remotas datadas desde meados do século XVII (1650 – 1670). Consta que antes disso, lá estavam os índios Quesqués, índios de cor branca e costumes menos bárbaros , que povoavam as margens do Pajeú e levavam suas tendas e brigas até o outro lado da Borborema, chegando até o Araripe no Ceará.
O povoamento de Flores está ligado à chegada dos sertanistas e vaqueiros da Casa da Torre (fazenda instalada na Bahia, pertencente ao português GARCIA D´AVILA, cujos descendentes se tornaram os maiores proprietários de terras do Brasil) a partir de 1654, após a expulsão dos holandeses do Nordeste. A primeira fazenda foi instalada em Flores pelo sertanista DOMINGOS AFONSO SERTÃO, tendo ele batizado a ex-aldeia de índios, de Pajeú das Flores. De 1655 até 1760, toda a história dessa região vizinha, foi feita pelos homens ligados à citada Casa da Torre. Fazendas e currais se instalavam ao longo do Pajeú e seus riachos, ou onde pudesse ter água perene.
Vale registrar também um dos fatos que teve maior importância na ocupação desses sertões. Foi a chamada “guerra dos bárbaros”. Aconteceu entre 1694 e 1702. Os índios do Pajeú, do Piancó e do Piranhas se revoltaram e botaram a correr todos os ocupantes das terras dessas regiões, ficando o sertão desocupado. Em 1678 os senhores da Casa da Torre receberam autorização para guerrear contra os índios do Rio Pajeú. A povoação de Flores foi destruída nessa guerra. Para combater os índios, veio o Coronel MANOEL ARAÚJO DE CARVALHO, fazendeiro do São Francisco, a mando da Casa da Torre. Este, combateu- os, subjugou-os e pacificou o sertão. A partir daí, o sertão voltou a ser repovoado por fazendeiros e vaqueiros. É provável que ao passar do Pajeú ao Piancó, no combate aos índios, o Coronel Araújo deva ter passado na região de Princesa ou nos seus arredores.
Pelo lado norte, no Vale do Piancó, toda a região pertencia à Casa da Torre desde 1654, e que após a dita “guerra dos bárbaros” estava sendo desbravada pelos grandes sertanistas baianos, desbravadores dos sertões da Paraíba, os OLIVEIRA LEDO, a serviço da Casa da Torre. Esta ocupação inicial das terras ao norte da região de Princesa aparentemente não teve papel preponderante no desbravamento da mesma.
As terras que não pertenciam a Casa da Torre, ou outros ocupantes, eram consideradas devolutas, e pertenciam ao Governo Português (éramos ainda colônia de Portugal). Eram as sesmarias . Para ocupar estas terras, o governo as distribuía com títulos de sesmarias. E os ocupantes se tornavam sesmeiros. São conhecidas também como “datas” ou “dadas”. Tinham tamanho definido, sendo as dimensões limites de 3 léguas de comprimento por 1 légua de largura, ou aproximadamente 130 quilômetros quadrados (a légua de sesmaria equivalia a 3000 braças ou 6600 metros).
A primeira sesmaria na região de Flores, está registrada em nome do português CUSTÓDIO ALVES MARTINS em 1695, e se situava na região de Itapetim-São José do Egito. Flores era ainda uma aldeia-povoação, com seus habitantes tapuias e alguns poucos colonos. Esse mesmo sesmeiro, em 1695 consegue mais uma sesmaria, onde hoje é a região de São João do Cariri (Pb).
Também próximo à região de Princesa, com fronteiras com o antigo distrito de Manaíra, está o Município de Serra Talhada (ex-Vila Bela). Lá, em 1700, instalava-se o português AGOSTINHO NUNES DE MAGALHÃES com uma fazenda de criar gados.
Já próximo da data do desbravamento de Princesa, em 1756, foi requerida uma sesmaria pelo Capitão JOÃO LEITE FERREIRA, do Sítio Espírito Santo, na Serra da Baixa Verde. Foi posteriormente rejeitada a concessão por embargo da Casa da Torre que reivindicou a propriedade anterior. Os demais sítios sobre a referida Serra já estavam também ocupados por rendeiros à Casa da Torre (sítios Corrente, Santa Maria, Timbaúba, Bom Jesus, etc.).
Veremos, depois, que os desbravadores de Princesa que aí viveram eram rendeiros e de lá partiram para chegar até essa região, inclusive um dos personagens mais conhecidos dos princesenses – NATÁLIA MARIA DO ESPÍRITO SANTO.
As terras onde hoje se situa Princesa, até esta época eram virgens, inóspitas e despovoadas e ainda intocadas pelos pés dos desbravadores. Embora, talvez de quando em quando, índios, escravos fugitivos e os famosos caçadores perdidos da antiga lenda, tenham andado por estas plagas!
Toda a história contida até aqui, são os fatos antecedentes à chegada dos desbravadores à região de Princesa.
Ocupados os vales férteis do Piancó e do Pajeú, e as regiões úmidas da Serra da Baixa Verde (Triunfo), por sesmeiros, rendeiros e posseiros, a ocupação teve continuação nas terras mais altas, subindo em direção à Serra da Borborema, sempre seguindo os cursos dos riachos e se fixando onde pudesse ocorrer pontos d´água permanentes. De Flores - no Pajeú - à Princesa, são apenas 18 quilômetros. De lá partiram os baianos, pernambucanos, brasileiros e portugueses e foram subindo os Riachos da Velha, do Merejo, do Galego, da Malhada, do Gigante, e outros, pelo lado sul.
Pela Serra da Baixa Verde (Serra de Triunfo) abaixo, seguindo o Riacho Piancozinho ou Cachoeira foram ocupando as terras que se tornaram as hoje cidades de São José de Princesa e Manaíra, antigos distritos de Princesa.
Pelo lado norte, subindo pelos Riachos Gravatá, Bruscas, Bom Jesus, Canoas e tantos outros, foram vindo os da mesma origem acima indicados e os paraibanos já instalados no Piancó. Devido a maior distancia do Piancó à Princesa (aproximadamente 100 km), estes desbravadores só chegaram com seus currais e fazendas, nos limites do norte-noroeste-nordeste de Princesa - Manaíra – Tavares – Jurú – quase 20 anos depois daqueles que vieram pelo lado pernambucano. Numa das cartas de doação de sesmarias, em 1756, se indicava que a “última fazenda pelo lado do Piancó era a de São Boaventura (atualmente cidade do mesmo nome) na direção do Pajeú.”
Além das distâncias dos Vales do Pajeú e do Piancó, da falta d´agua, ainda – até 1753 – todas as terras disponíveis em torno destes vales, eram reivindicadas pela Casa da Torre (Bahia), o que tornava os possíveis interessados nas terras, em rendeiros e não em proprietários, e as distâncias e os riscos das secas não justificavam ou compensavam os resultados da exploração. Em 1753, o Rei de Portugal (D. José I), anulou, aboliu e cassou todos os direitos às terras que haviam sido doadas à Casa da Torre e de outros sesmeiros, que as possuíam sem cultivá-las. Foi esta decisão real que efetivamente fez a grande mudança e estimulou a quem tivesse interesse nas terras agora disponíveis a reivindicar novas cartas de sesmaria.
As terras onde hoje se situa o Município de Princesa Isabel, estariam também dentro daquelas que pertenciam à Casa da Torre, por dedução do que acontecia nas regiões circunvizinhas. Só a partir de 1753, por falta de ocupação é que veio a estimular e permitir que novos interessados pedissem novas sesmarias.
O DESBRAVADOR
É então que aparece um primeiro e novo personagem na história da ocupação de Princesa: LOURENÇO DE BRITO CORREIA. Foi ele que em 1766 requereu ao governo da Paraíba as terras em torno da Lagoa da Perdição (situada no centro da atual cidade de Princesa Isabel), numa extensão de 19.800 metros (3 léguas antigas) por 6.600 metros (13.068 hectares), que iam aproximadamente do Riacho d´Antas (Laje), até o Riacho Grande (Várzea). Daí seguia até a Escorregada no Riacho Gravatá. Seguindo daí pelo Riacho Tapuio acima, até chegar ao Sítio Jatobá (vizinho ao Sitio das Trincheiras) e daí, retornando, pela Serra do Gavião até chegar de volta ao Riacho d´Antas. Assim, essa sesmaria continha todo o território onde hoje está situada a cidade de Princesa Isabel. Da mesma forma que Cabral “descobriu” o Brasil e que a carta de Caminha seria a “certidão de batismo” do Brasil, LOURENÇO DE BRITO “descobriu” a região de Princesa e a sua carta de sesmaria pode ser considerada sua certidão de batismo.
LOURENÇO era um provável descendente dos sesmeiros baianos que ocuparam as regiões da mata sul de Pernambuco (Palmares, Garanhuns, Rio Una) após a derrota dos negros do Quilombo dos Palmares (1750). Encontramos diversas sesmarias nesta região em nome de outros BRITO CORREIA. Nascido entre 1700-1740. Foi casado com CATARINA DE BARROS CAVALCANTI, pernambucana. Pai de JOSÉ D´ARAUJO CAVALCANTI (que foi o segundo marido da viúva NATARIA MARIA DO ESPÍRITO SANTO) e de IGNÁCIA DE BARROS CAVALCANTI.
Após sua carta de sesmaria (vide imagem abaixo), LOURENÇO instalou-se no sítio Escorregadinha, a partir de 1790, que se tornou a sede da FAZENDA DA PERDIÇÃO, nome com que foi conhecido o local por quase 100 anos, até 1858, quando, em torno da LAGOA DA PERDIÇÃO, se formou a POVOAÇÃO DO BOM CONSELHO.
OUTROS DESBRAVADORES
Após a primeira sesmaria obtida por LOURENÇO DE BRITO, seguiram-se outras das terras onde vieram a se formar os futuros distritos e povoados de PRINCESA – São José, Manaira, Tavares, Juru, Agua Branca, Patos, Belem e outros. No quadro abaixo, estão relacionadas por ordem cronologica estas sesmarias:
Data
sesmeiros
Local descrito na sesmaria........ denominação atual
1767
FELIPE GOMES DE LEIROS
SERRA NEGRA ................ LIVRAMENTO/SÃO JOSÉ
1775
JOSÉ GREGORIO BEZERRA
RIACHO MOCAMBO........CANOAS/MOCAMBO/ARARA
1776
JOÃO DE SOUZA
LAGOA JUNCO......... JUNCO/MIXILA/INACIO ALVES
1777
FCO ARRUDA CAMARA
RCHO GRAVATÁ/MACACOS..... N. OLINDA/VARZEA CRUZ
1785
JOSE DE BARROS PEREIRA
RCHO PILOES/CALDEIRÃO............ TAMBORIL/LAVANDEIRA
1785
FCO GONÇALVES LISBOA...............
RCHO CACHOEIRA/S. BRANCA.... JURU/AGUA BRANCA
1787
PEDRO PEREIRA DA SILVA
PITOMBEIRA..............PITOMBEIRA / TAVARES
1787
MANOEL DE SOUZA BARBOSA.......
BELEM.................... BELEM/MANAIRA
1788
LÇO DE BRITO CORREIA..............
RCHO MACACO/ESCORREGADA....MACACOS/TIMBAUBA
1788
FRANCISCO FREIRE MARIZ ...........
LAGOA CARNAUBA.............................CARNAUBA/JURU
1790
JOSÉ RODRIGUES MARIZ
CONTENDAS/SERRA BRANCA...... CHAPADA/TAVARES/JURU
1790
FRANCISCO FREIRE MARIZ
SERRA BRANCA/BARRA.................. RIACHO EXU/JURU
1791
JOSE D’ARAUJO CAVALCANTI
RCHO VELHA/ESPINHEIRO.... .........BUENOS AIRES/MACACOS
1792
SEBASTIÃO ARAUJO E SILVA
RCHO DA ONÇA/BELEM ........ POÇO CACHORRO/R. ONÇA
1809
JOSÉ DA COSTA ALMEIDA
SERRA BRANCA...................... SERRA BRANCA/TAVARES
1815
JOSE DOS SANTOS SILVA
CANOA/BALANÇA............ SERRINHA/CANOA/BALANÇA
1815
MANOEL GOMES DA SILVA
LAGOA S JOÃO/GAVIÃO......... LAGOA S JOÃO/GAVIÃO
1816
LUIZ G. ALBUQUERQUE
GLORIA/CAMPOS ..................... CALDEIRÃO/CAFUNDÓ
1816
JOSE DE PAIVA MATOS
LAGOA PERDIÇÃO/BUENOS AIRES....... LAGE/BUENOS AIRES
1816
RICARDO ALCOFORADO
POÇO REDONDO ........................JURU
1816
SILVESTRE MARTINS OLIVEIRA
NORTE DE SÃO JOSÉ..... SALGADINHO/JACU/S.JOSÉ
1816
JOSÉ ANT. DE SOUZA
S. BRANCA/STA CLARA..... RAJADA/CATINGUEIRA/JURU
1816
DOMINGOS ALVES FEITOSA
SERRA BRANCA/EXU ...... SÃO FRANCISCO/A. BRANCA
1817
FRANCISCO SILVA LIMA
RIACHO CACHOEIRA...............CACHOEIRA MINAS
1817
FRANCISCO GOMES TORRES
ALAGOA TAVARES....................TAVARES
1818
JOSÉ BEZERRA LEITE
RIACHO DO MEIO.............MANAIRA/SÃO JOSÉ
Em 1822 (ano da Independência do Brasil), todas as doações de terras por sesmarias foram suspensas. Encerrou-se assim este processo de ocupação das terras do sertão. Esta relação das primeiras sesmarias serve para se visualizar a antiguidade da chegada dos desbravadores na região de Princesa e identificar as famílias que nela se instalaram. Alerta-se que as demarcações das sesmarias eram bastante imprecisas e na maior parte dos casos, seus limites são aproximações e nem sempre os possuidores de sesmarias chegavam a ocupar as terras efetivamente.
OCUPAÇÃO COMPLETADA
Com a independência do Brasil em 1822, foi suspensa a distribuição de terras devolutas por sesmarias. Somente em 1850, com a “Lei de Terras” é que novamente se regulamentou a ocupação dessas terras. Neste período (1822-1850), completou-se a ocupação da região de Princesa, através de compra e venda de propriedades, fazendo com que muitas terras de antigas sesmarias fossem se subdividindo e sendo ocupadas por novos proprietários, que viriam a se constituir nas futuras famílias que se estabeleceram na região, alem dos antigos sesmeiros e seus herdeiros.
Especificamente na região que hoje se constitue o Municipio de Princesa Isabel, onde se situava a sesmaria de LOURENÇO DE BRITO CORREIA, falecido em 1799, herdaram suas terras, sua viúva CATARINA DE BARROS CAVALCANTI e seus dois filhos JOSE D’ARAUJO CAVALCANTI e IGNACIA DE BARROS.
Em 1791, JOSÉ D’ARAUJO tinha também obtido uma sesmaria vizinha ao do seu pai, que ia do Riacho da Velha até o sitio Macacos (Nova Olinda). Já em 1816, ele vendeu as terras do lado sul da Lagoa da Perdição, que ia do sitio Lage até o sitio Buenos Aires, à JOSE DE PAIVA MATOS (patriarca da família PAIVA que se instalou nos sítios Rancho dos Homens, Cedro e Lagoa de S João). Todas as demais terras em torno da Lagoa da Perdição, até o sitio Espinheiro, no poente, descendo até o sitio Canoas, subindo o riacho do Vinho, até o sitio Serrinha, pelo lado norte e passando pelo sitio Carneiro até voltar à Lagoa da Perdição, limitado ao nascente pelo sitio Gavião e Cedro, pertenceram à JOSE D’ARAUJO CAVALCANTI e seus herdeiros. Este, em 1816 fica viúvo e casa-se com NATARIA (ou NATALIA) MARIA DO ESPIRITO SANTO, também viúva. Sobre esta personagem lendária na história princesense, apresentarei maiores detalhes nos próximos artigos. Foi portanto por herança, que NATALIA se tornou proprietária de metade das terras acima descritas, após o falecimento de JOSE D’ARAUJO em 1836. Durante este período, desde a sesmaria inicial (1766) até 1858, a região acima delimitada foi conhecida como FAZENDA PERDIÇÃO.
Há registros desta época, de atividades e moradores no local. Estes registros também indicam que os antigos proprietários, JOSE D’ARAUJO e NATALIA aqui não residiam, e sim na então Vila de Flores (Pe) e Sitio Espirito Santo (em Triunfo – Pe), talvez por conta das distancias e falta de conforto numa fazenda nestes confins do sertão. Paralelamente, nas vizinhanças vão se instalando novas famílias, tais como os MEDEIROS, CARLOS ANDRADE, RAPOSO (Queimadas, Capoeiras, Boa Vista, Oitis, Lage, Jericó,) ao sul (Pe), os FERREIRA RABELO (Buenos Aires, Manaira), LUZ , BEZERRA LEITE, MARTINS, (São José, Manaira), FLORENTINO (Patos), CAVALCANTI, TAVARES (Piancozinho, Patos), RODRIGUES MARIZ , PAIVA, MEDEIROS (Rancho dos Homens, Cedro, Lagoa S João), ALMEIDA , FREIRE MARIZ, GOMES, FEITOSA (Tavares, Juru, Agua Branca). Estas famílias primeiras, se entrecruzaram intensamente, formando a base da grande família princesense, que viria preparar o ambiente para o inicio da urbanização que viria a seguir.
Parte do documento original da sesmaria existente no Arquivo Público do Estado, em João Pessoa - Pb
Quando D. NATARIA (ou NATALIA) chegou na região de Triunfo (Pe), entre 1790–1795, LOURENÇO DE BRITO já estava instalado na região de Triunfo e Princesa há mais de 30 anos.
LOURENÇO faleceu em 1799, ainda residente na Escorregadinha, onde criava gados e tinha suas lavouras. LOURENÇO também foi rendeiro de terras pertencentes à Casa da Torre, na região de Triunfo, dos sítios CORRENTE e SANTA ROSA, no período 1770-1780. Em 1788, o mesmo requereu e obteve outra sesmaria vizinha a que ele já tinha, no lado norte, que ia da Escorregada até o sitio Macacos (sítio Nova Olinda), incluindo as terras onde hoje se situam os sítios Timbaúba, Bexigas, Salobro, Serrinha e outros.
Assim, LOURENÇO DE BRITO CORREIA, deve ser reconhecido como o primeiro desbravador das terras princesenses, aqui instalando-se e iniciando o primeiro núcleo da colonização portuguesa na região.
(Quem estiver interessado em aprofundar-se na discussão sobre as primeiras sesmarias na região de Princesa, consulte a publicação do também princesense, EMMANUEL CONSERVA de ARRUDA, na sua monografia de conclusão do Curso de Licenciatura em História pela UFPb, sob o titulo “Fronteiras da Perdição”, 2003).
Enquanto isso... LOURENÇO não ia ficar muito tempo sem vizinhos. De 1767 até 1788 (data da segunda sesmaria), outros sesmeiros pediam e obtinham terras, onde hoje se situam os municípios de SÃO JOSE DE PRINCESA e MANAÍRA, no lado oeste. Pelo lado leste (nascente) foram pedidas sesmarias, onde hoje se situam TAVARES, JURU e ÁGUA BRANCA, todos eles ex-distritos que compuseram o município de PRINCESA ISABEL nos seus primórdios, quando da sua emancipação do PIANCÓ em 1875, até quando também se emanciparam entre 1960 -1990.
Pelo lado sul, divisa com Pernambuco, as terras iam sendo ocupadas pelas famílias Medeiros, Paiva, Carlos de Andrade, Freire Mariz, Rodrigues Mariz, Ferreira Rabelo, Gomes e outras que se tornariam as principais famílias a povoarem a região. As sesmarias de LOURENÇO DE BRITO devem ter servido para que mais interessados fossem atraídos pelas terras ainda não ocupadas.
CHICO SOARES - “CANHOTO DA PARAÍBA”
APRESENTAÇÃO
No dia 24 de abril último, CHICO SOARES deixou esta vida. E entrou na História. De Princesa, da Paraíba, do Brasil e até do mundo. Nesta época de memória curta, CHICO já era um esquecido, mesmo entre seus conterrâneos princesenses, exceções raras entre aqueles contemporâneos ainda vivos e alguns poucos conhecedores e admiradores de sua arte musical. Entre nós, princesenses, começou um resgate da vida e obra desse conterrâneo impar, em 2004, por ocasião das comemorações da emancipação política do nosso Município. Coordenado pela Secretaria de Educação e Cultura da Prefeitura de Princesa Isabel, foi desenvolvido um enorme projeto de resgate da história de CHICO SOARES, intitulado “CANHOTO DA PARAÍBA – DE PRINCESA PARA O MUNDO”.
Este projeto envolveu 4500 crianças e jovens da rede municipal de ensino, seus professores e técnicos. Eu, ANTÔNIO DELANO e JOÃO MANDU participamos intensamente deste trabalho, em palestras, entrevistas e textos. Quem viu os resultados na exposição final dos trabalhos se emocionou! Milhares de jovens princesenses escreveram textos, poesias, cartas, desenharam e pintaram, modelaram figuras e ambientes, tocaram e ouviram a música de CHICO.
Foram produzidos vídeos, entrevistas, palestras, sempre sobre o mesmo tema. A Rádio Princesa, a Igreja Católica, a Câmara Municipal também participaram do evento. Foi realizado o “I CONCURSO DE VIOLÃO – CANHOTO DA PARAÍBA“. Uma rua ganhou o nome de “CHICO SOARES – CANHOTO DA PARAÍBA”. Eu testemunhei – emocionado – uma garota de 12 anos, que descrevia a vida e obra de CHICO, como se ele fosse um seu contemporâneo ou mesmo alguém de sua família. Nenhuma publicação, filme, exposição ou outro meio de divulgação, sozinho, teria conseguido esse resultado! Praticamente uma nova geração descobriu um novo personagem magnífico e, por cima, um conterrâneo. Infelizmente, nesta comemoração não tivemos a presença física do homenageado, por absoluta impossibilidade física do mesmo, de poder se deslocar até nossa cidade.
Em novembro de 2006, com o apoio da Prefeitura Municipal e principalmente de amigos, especialmente do velho amigo ANTONIO DELANO, CHICO fez sua última visita à terrinha querida. De novo testemunhei quando ele confessou que aqueles foram dias dos mais felizes de sua vida. Recebeu ele homenagens, presentes, reviu velhos e novos amigos, tendo sido realizado um evento que se chamou “NOITE DA SAUDADE”, em que foi feita uma belíssima apresentação de músicos princesenses, jovens e maduros, na Pousada do Cedro, que o fez ir às lágrimas de emoção, como aos que lá estiveram. Tudo isso está registrado em fotos e vídeo, que poderão ser vistos no site do conterrâneo MARDSON MEDEIROS (www.princesapb.com).
E agora, quando CHICO se despediu da vida, de novo, seus conterrâneos, com o apoio oficial e dos seus eternos admiradores, demonstraram suas melhores emoções pela partida do amigo e do conterrâneo, através das mais variadas formas de expressão, tais como a programação especial da Radio Princesa, informação da população por carro de som, serviço de som da Matriz local, ato público com participação de músicos locais, luto oficial do município e representação oficial no enterro, com a presença do Prefeito THIAGO PEREIRA e comitiva.
Faço esta longa apresentação, para registro histórico. Que se registre, que o povo princesense, um dia, voltou a se lembrar de um de seus melhores filhos, reverenciou-o e refez uma parte da sua memória coletiva. Que assim agindo, aprendeu a valorizar o que nossa terra melhor pode produzir: homens e mulheres excepcionais, tal como este que acabou de partir:
CHICO SOARES – O CANHOTO DA PARAÍBA!
Para aqueles princesenses – ou não – que pouco ou nada sabem sobre este personagem, apresento uma biografia, que se não está completa, é por conta da sempre limitação de espaço que um jornal nos impõe, pois o que se pode dele escrever, daria um livro de muitas paginas. Livro que desde já espero que um conterrâneo ou não, motive-se a escrevê-lo!
BIOGRAFIA
AS ORIGENS
FRANCISCO SOARES DE ARAUJO
nasceu em 19 de março de 1926, na cidade de Princesa Isabel, Paraíba. Exatamente na rua Coronel Antonio Pessoa, 30 - hoje rua Músico CHICO SOARES (CANHOTO DA PARAÍBA). Filho do segundo casamento do seu pai – ANTONIO SOARES DE ARAUJO, com QUITERIA LOPES DE ARAUJO. Família grande, com 4 irmãos e 5 meio-irmãos. O avô de CHICO – JOAQUIM SOARES – era clarinetista. O pai, violonista (e sacristão de profissão). Dois irmãos – LULA e GIA – também eram músicos. Na sua casa reuniam-se os principais músicos de Princesa, como o acordeonista Zé Costa, os violonistas Zé Micas e Luiz Dantas, o saxofonista MANOEL MARROCOS, o regente da banda local JOAQUIM LEANDRO que lhe ensinou as primeiras notas. Na sua casa eram constantes as serenatas e saraus musicais. Pode-se assim entender a origem da veia musical de CHICO SOARES!
NASCE UM MÚSICO
Nesse ambiente farto de sons e musicalidade, aos 12 anos, fascinado pelo tocar de violão do pai, ganha como presente deste um violão - que foi destruído num acidente-, vindo somente a ter outro aos 15 anos. CHICO era canhoto e se tivesse que adaptar o violão a essa sua característica, teria que alterar todo o encordoamento do instrumento. Como esse violão era dividido com os demais “tocadores de violão” da família, CHICO terminou se adaptando e desenvolveu aquilo que o tornou nacionalmente conhecido – usar o braço do violão no lado do ombro direito. Daí, anos depois, em Recife, ganhar o nome artístico de “CANHOTO DA PARAÍBA”. Dominado o instrumento, orientado pelo pai, pelo tio e por outros músicos princesenses, ele passou a tocar em festas, serenatas e nas radio-difusoras de Princesa: a VOZ DE PRINCESA E IBIAPINA. Em 1944, com 18 anos, foi levado para Recife pelo frade carmelita FREI CASANOVA, para tentar um emprego na Rádio Clube de Pernambuco. Por saudade, desistiu e voltou para Princesa, de onde só saiu em 1951, já com 25 anos. Contam alguns contemporâneos seus, que CHICO vivia em quase todos os momentos diários junto a seu violão, como se fosse uma extensão do seu corpo e de sua alma! Assim, pode-se afirmar que “Princesa foi o berço e a grande escola onde se moldou e se formou o gênio musical” que foi CHICO SOARES!
NASCE A ESTRELA “CANHOTO DA PARAÍBA”
Em 1951, levado pelo então Deputado ANTONIO NOMINANDO DINIZ, assinou contrato com a Rádio Tabajara de João Pessoa, onde ficou até 1957. Lá, conviveu com grandes músicos, como SIVUCA e LUPERCE MIRANDA.
Com a companheira MARIA LACERDA (Nazinha), teve 2 filhas - Lourdes e Corrinha - que são nomes de valsas de sua autoria.
Em 1955, com 29 anos, fica viúvo. Em 1957, transfere-se para Recife, onde vem a integrar o elenco da Radio Jornal do Comercio (aquela que falava “de Pernambuco para o mundo”). Em Recife, ele amplia o círculo de amizades com importantes nomes do “CHORO” (um estilo musical). E ganha o nome de “CANHOTO DA PARAÍBA” dado por um produtor do programa de radio “luar do sertão” da Rádio Jornal do Comercio, de Recife.
Em 1959, CHICO vai ao Rio de Janeiro, numa viagem de jipe de 5 dias, junto com amigos e tem o grande encontro com a nata dos “chorões” cariocas, onde causou a mais vívida impressão pela sua técnica inimitável e pela sonoridade e estilo, revelando-se um mestre na arte da composição e um virtuose do seu violão canhestro, no dizer do músico e produtor musical Hermínio de Carvalho. O conhecido músico PAULINHO DA VIOLA registra que foi nessa ocasião, que entusiasmado pela performance de CHICO, ganhou enorme motivação para sua futura carreira musical.
Voltando para Recife, casa-se com EUNICE GADELHA, de quem teve mais duas filhas: FÁTIMA e VITÓRIA, que também são nomes de valsas de sua autoria.
Em 1968, grava seu primeiro disco (LP) – ÚNICO AMOR – pela produtora pernambucana Rozemblit.
Em 1971, grava um segundo disco (LP) – UM VIOLÃO DIREITO NAS MÃOS DO CANHOTO – gravação particular, financiada por amigos e admiradores.
Em 1977, produz seu terceiro disco (LP) “CANHOTO DA PARAÍBA, O VIOLÃO TOCADO PELO AVESSO", pela produtora Marcus Pereira.
Em 1993 e 1994, mais um disco (LP) “PISANDO EM BRASA” e o primeiro CD “COM MAIS DE MIL”. O primeiro pela produtora Caju Music e o segundo pela produtora Marcus Pereira. Ao longo de sua carreira artística, teve participação destacada em muitos outros títulos de discos, além de ter suas belas composições apresentadas por outros músicos.
É a grande fase, o apogeu da carreira, com viagens, tournées, shows, sendo um dos artistas mais requisitados nos eventos musicais do Recife e outros lugares. Era preciso agendar com bastante antecedência para se ter oportunidade de ter o artista nos eventos. Em 1996-1997, em projeto apoiado pelo Banco do Brasil, animado pelo seu Superintendente Regional na PARAÍBA – GERALDO AZEVEDO – que CHICO teve sua última grande presença no cenário artístico, apresentando-se em mais de 50 cidades da PARAÍBA e até em Portugal.
Em 1995, com 69 anos de idade e 51 de carreira artística, aposenta-se por tempo de serviço num pequeno emprego que tinha no SESI de Recife, onde era funcionário da assistência social, e pelo tempo que trabalhou na Transportadora Relâmpago, onde era mantido pela amizade do seu proprietário, para animar os eventos de lazer naquela empresa. Nesse período, CHICO veio muitas vezes à Princesa. Era sempre o grande reencontro. Gerava admiração, curiosidade e encanto com sua maestria. Era a grande notícia. O comentário principal dos princesenses. Em 1996, na Semana da Cultura, por ocasião da data da emancipação do Município, CHICO e MANOEL MARROCOS – outro grande músico princesense – foram as figuras de destaque. Sua última visita ainda saudável foi em dezembro de 1997, a convite de JOÃO MANDU, para participação na Festa da Padroeira. Como escrevi acima, na apresentação, em 2004, CHICO foi a figura central da mesma comemoração oficial, a qual não compareceu por conta da doença, e, em 2006, sua última visita à Princesa, a despedida e, sem dúvida - pelo que testemunhei – uma de suas últimas grandes alegrias.
ESVAI-SE A ESTRELA
Em 8 de abril de 1998, aos 72 anos, um derrame (AVC) atinge CHICO com efeito devastador na sua capacidade física e mental. O lado esquerdo paralisado, impossibilitou-o de tocar o seu velho companheiro violão - a “tabuinha” como o apelidava. Falava com dificuldade, não andava e precisava de fisioterapia permanentemente. Somando-se a esta tragédia, uma outra se abateu sobre ele, ao ficar viúvo pela segunda vez. Passou então a viver com a filha Vitória Gadelha até os últimos dias. Morava, nos últimos anos, em Paulista, cidade pernambucana na área do Grande Recife, no bairro Maranguape I, numa casa simples, sem maiores confortos, mas cheia de recordações, principalmente de sua terra natal, assunto permanente em suas conversas e entrevistas.
CHICO tinha como principal fonte de renda uma aposentadoria de seis salários mínimos, que estava longe de cobrir as despesas com as suas sessões de terapia diária. Assim que souberam do seu grave estado de saúde (chegou a ser internado em UTI), vários dos grandes nomes do chorinho e do samba, cariocas e pernambucanos, realizaram no Teatro Guararapes, com produção da Raio Lazer, um show beneficente para o violonista. Estiveram lá desde o seu maior fã, PAULINHO DA VIOLA, ao mitológico ÉPOCA DE OURO (grupo que acompanhava Jacob do Bandolim), ALTAMIRO CARRILHO, e os pernambucanos DALVA TORRES, NUCA, RACINE, CLÁUDIO ALMEIDA, NENÉO LIBERALQUINO. A renda líquida, R$ 27.180,00, transferida para CHICO, foi gasta no tratamento intensivo a que ele era submetido na época.
AS HOMENAGENS TARDIAS
Em 2002, numa iniciativa inédita no país, Pernambuco foi o primeiro estado brasileiro a instituir, no âmbito da Administração Pública, o Registro do Patrimônio Vivo, que reconhece e gratifica com uma pensão vitalícia mensal representantes da cultura popular e tradicional do Estado. Um dos primeiros agraciados foi CHICO SOARES, junto com outros músicos pernambucanos como Camarão, Lia de Itamaracá e Mestre Salustiano. A cerimônia de entrega dos primeiros 12 títulos de Patrimônio Vivo de Pernambuco, aberta ao público, foi realizada em frente ao Palácio do Governo do Estado (Campo das Princesas), no Recife, às 19 h do dia 31 de janeiro de 2006.
No dia 9 de junho de 2004, durante a cerimônia de reabertura do Projeto Pixinguinha, o Presidente LULA homenageou CHICO SOARES como um dos mais geniais músicos brasileiros. Uma escolha justa, já que no projeto original, a turnê – em 1977 - de CHICO com PAULINHO DA VIOLA foi uma das de maior sucesso. Quando, em 1997, o projeto Pixinguinha foi cancelado na última hora, estavam previstas apresentações de CHICO SOARES com o violonista CAIO CÉZAR.
Em 2004, homenageando à CHICO SOARES, o Governo do Estado da Paraíba criou o Registro dos Mestres das Artes (REMA), conhecido como LEI “CANHOTO DA PARAÍBA”. Esta Lei garante o benefício de dois salários mínimos mensais a artistas de reconhecido valor, cujo trabalho tenha contribuído ao longo dos anos para a formação do patrimônio cultural paraibano. A Lei de nº 7.694, de 22 de dezembro de 2004, foi publicada no Diário Oficial do Estado do dia 16 de julho de 2005. Seu primeiro artigo registrará – de forma indelével – o nome de CANHOTO DA PARAÍBA todas as vezes que um artista paraibano ganhar seu direito mínimo à sobrevivência, dado pela sociedade que dele recebeu sua contribuição artística.
“Art. 1º Fica instituído, no âmbito da Administração Pública Estadual, o Registro dos Mestres das Artes – Canhoto da Paraíba (REMA-PB), a ser feito em livro próprio, a cargo da Secretaria da Educação e Cultura do Estado da Paraíba, assistida, neste mister, na forma prevista nesta Lei, pelo Conselho Estadual de Cultura, criado pelo Decreto nº 3.930, de 10 de agosto de 1965.”
OCASO DA ESTRELA
Os últimos anos de vida do grande artista: doente, sem recursos, esquecido do grande publico e protegido de última hora pelo poder público. Mas CHICO também foi grande na dor. Resignado, conviveu com a doença, e guardando seu jeito, seu sorriso, encantou ainda a tantos que o visitava em sua residência.
E assim, passados 10 anos de uma longa jornada de sofrimentos após o AVC que o atingiu, CHICO SOARES – O CANHOTO DA PARAÍBA – deixou esta vida para entrar na história. Familiares, amigos de ontem e de hoje, conterrâneos e admiradores se despediram emocionados, ficando seus restos mortais no cemitério de Paulista. Quem sabe, provisoriamente, até o dia em que os conterrâneos princesenses resgate-os e traga-os para repousar eternamente sobre a Serra da Borborema, em sua terra natal, paixão de sua vida, sua terrinha - PRINCESA ISABEL - que dele foi berço e dele poderá ser último repouso.
CHICO SOARES – O SER HUMANO ADMIRADO
DEPOIMENTOS
Resumidamente, descrevi os caminhos da vida e da obra de CHICO SOARES. Mas sabe-se que, dentro de cada ser humano existe um jeito de ser que só é percebido pelos que o rodeiam, que com ele convivem. Assim, deixo aqueles que um dia cruzaram seus caminhos com o de “CHICO SOARES” e ou “CANHOTO DA PARAÍBA” darem seus testemunhos:
Luiz Gonzaga – o grande sanfoneiro: “Chico Soares deveria ter adotado outro nome artístico em sua carreira - Canhoto do violão sorriso – tal é a sua alegria quando toca.
Revista Veja - 1993: “Canhoto consegue unir as qualidades que todo músico persegue ao longo da vida: técnica apuradíssima e espontaneidade digna de uma criança”
Luiz Nassif - jornalista de renome nacional: “Nunca vi pessoa tão doce, poucas vezes ouvi músico tão talentoso!"
Fernando Caneca - compositor, violonista recifense: “Ele (Chico) é um ensinamento. Mesmo na enfermidade, continua sendo capaz de transmitir sentimentos essenciais”
Aldemar Paiva - escritor e jornalista pernambucano: Chico Soares veio vindo para Pernambuco com o seu violão. Simples e bom. De 1958 pra cá, soube tornar-se a figura artística mais requisitada do nosso amado Recife. Ninguém melhor do que ele se enquadrou no espírito feliz desta cidade...”
Amigos de Canhoto - na capa do cd ”Único Amor”: “O que é um fenômeno? É tudo aquilo que é maravilhoso, surpreendente e raro, percebido pelos sentidos ou pela consciência. É aquilo que se distingue nas pessoas, não obstante simples e modestas, dotadas de um talento extraordinário. Desta forma, queremos nos referir ao talentoso e extraordinário violonista Chico Soares, nascido em Princesa Isabel”
Paulinho da Viola - músico carioca: “Eu não queria participar daquelas rodas (de choro) como músico. Quando vi o canhoto tocar, fiquei tão entusiasmado que me toquei. Era tão sublime, tão tecnicamente perfeito. Acho que o Canhoto me influenciou a tocar, mais do que meu pai e Jacob do Bandolim.”
Jacob do Bandolim – músico carioca renomado: Numa entrevista, comentando o encontro dele com Chico no Rio de Janeiro: ...”Chico é um artista enterrado lá em recife... É digno de toda nossa admiração, de todo nosso respeito, porque ele encarna nesta figura, uma porção de brasileiros que vivem enterrados por estes rincões afora, verdadeiros valores completamente no ostracismo...”
Baden Powel - violonista de fama internacional: “Eu, Baden Powel, sou músico e violonista há muitos anos, mas, em Recife, aprendi a tocar violão com Chico Soares”
João Albuquerque - produtor musical recifense: músico nato, homem simples, fibra de sertanejo de princesa, exemplar chefe de família e companheiro de trabalho. Caráter puro de menino feliz. Respeitando os compromissos assumidos, jamais nega-se a uma tocata para os amigos, independente da hora e do dia. Parece que o violão não o cansa, como também não cansa os que o ouvem tocar. Também não fez de seu instrumento um meio de vida no sentido de comercializá-lo. Fez do violão um instrumento de transmissão de sua música e de seus sentimentos“.
Antônio Delano – músico princesense: Chico era meu irmão. Amigo, companheiro de uma simplicidade ímpar. Doce como uma criança. Desligado das vaidades e das preocupações materiais. Pra ele tava tudo sempre bem, mesmo nos momentos mais difíceis da vida. Um exemplo de ser humano.
João Mandu - amigo e conterrâneo: Chico veio a este mundo com a missão de alegrá-lo com sua música e melhorá-lo com seu jeito de ser. Além do nome, Chico era um franciscano na sua humildade, desapego e no amor com que cantava a vida. O céu deve estar ainda mais animado com a chegada dele!
Urariano Mota – jornalista pernambucano: “existe um homem que é grande no tocar, existe um sereno e augusto artista que é largo e alto de coração, existe um violonista de nome Francisco Soares de Araújo, que a simplificação da gente achou por bem chamar de Canhoto da Paraíba.”
Em 2004, com o presidente Lula
Tocando com Manoel Marrocos
FONTE:
SITE PRICESAPB
(http://www.princesapb.com )
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